
O SEF num piscar de olhos
“Nos 35 anos da CIF-SEF“
A génese do SEF encontra-se no Decreto-Lei n.º 494-A/76, de 23 de junho, com a criação do Serviço de Estrangeiros, com autonomia administrativa e financeira, destinado a assegurar o controlo da entrada e permanência de cidadãos estrangeiros em território nacional.
Mais tarde, pelo Decreto-Lei n.º 440/86, de 31 de dezembro, veio reconhecer-se a necessidade de organizar um Serviço altamente especializado no domínio das migrações, garantindo uma ação unificada e especializada do circuito completo da informação e situação dos estrangeiros em Portugal. Pelo mesmo diploma foi criada a Carreira de Investigação e Fiscalização (CIF/SEF), estruturando formalmente a componente de polícia especializada e de investigação criminal no domínio da imigração ilegal e tráfico de pessoas.
O Decreto-Lei n.º 368/90, de 16 de novembro, veio estabelecer o regime de formação profissional e a criação do Centro de Formação do SEF, cuja primeira edição, iniciada em 15 de novembro de 1990, marcou o nascimento da primeira geração de inspetores especializados.

A 1 de agosto de 1991, estes inspetores assumiram o controlo de fronteira no Aeroporto Internacional de Lisboa, iniciando a profissionalização moderna do serviço.
Esta evolução jurídica consolidou o SEF como um organismo de soberania técnica, com competências próprias e coordenação direta com o Ministério da Administração Interna.
A criação da Carreira de Investigação e Fiscalização (CIF) marcou uma mudança de paradigma: o SEF deixou de ser um serviço meramente administrativo para se tornar uma entidade policial especializada no controlo das fronteiras de Portugal, na instrução dos pedidos de asilo, na fiscalização da permanência de cidadãos estrangeiros, instauração e execução do afastamento do território e, a partir de 1993, na investigação criminal de crimes associados aos fenómenos migratórios, designadamente, tráfico de seres humanos, auxílio à imigração ilegal e crimes conexos.
Esta nova configuração profissional transformou o SEF num modelo pioneiro em Portugal, combinando competências de polícia de fronteira e órgão de investigação criminal, num enquadramento jurídico equivalente ao das forças de segurança clássicas, mas com uma missão própria no domínio da mobilidade e da gestão dos fluxos migratórios.
O 1.º Curso de Formação da CIF/SEF iniciou-se a 15 de novembro de 1990, incluindo um estágio profissional que, com uma parte teórica e uma fase de estágio prático, abrangeu as principais vertentes da atividade operacional, desde o controlo documental até à investigação criminal.
Os inspetores formados nesse primeiro curso assumiram, a 1 de agosto de 1991, o controlo fronteiriço no Aeroporto Internacional de Lisboa, simbolizando o início de uma nova era de profissionalização, autonomia técnica e prestígio institucional.
A partir dessa data, o SEF foi consolidando o seu modelo de atuação, com uma reputação amplamente reconhecida e por muitos cobiçada.
A reputação do SEF sofreu um abalo severo após a morte de Ihor Homeniuk nas instalações do aeroporto de Lisboa, em 2020. O caso desencadeou intensa reação pública e política, servindo de pretexto para um discurso centrado na “humanização” e “modernização” do sistema migratório.
O contexto pandémico e a instabilidade governativa aceleraram o processo, conduzido de forma fragmentada e sem qualquer avaliação nem planeamento técnico.
A extinção formal consumou-se em 29 de outubro de 2023, com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 41/2023, encerrando 47 anos de história institucional.
As verdadeiras razões que estiveram na base da decisão política de extinção do SEF permanecem ainda na sombra, em flagrante contradição com um percurso histórico que evidencia uma trajetória coerente de consolidação técnica e excelência funcional, com adequada resposta aos desafios decorrentes da integração num espaço de liberdade segurança e justiça.
À data da sua extinção, o SEF contava 11 cursos de admissão na Carreira de Investigação e Fiscalização, com cerca de 900 inspectores, um quadro competente de pessoal da carreira do regime geral, com cerca de 700 funcionários, e uma carreira de técnicos informáticos alguns deles brilhantes, todos a manter um nível de desempenho profissional que por pouco menos do que um milagre, garantiam àquela data o funcionamento de um Serviço, sem recursos, sem qualquer apoio político, sem futuro.
Isto, depois de vários relatórios das instituições europeias terem reiteradamente, ao longo dos seus anos de existência, assinalado as suas boas práticas, classificando o SEF como um dos organismos mais eficientes e tecnicamente preparados da Europa, destacando a qualidade da formação e a rapidez na partilha de dados operacionais. Em suma, esta reputação era amplamente reconhecida.
O balanço histórico é inequívoco, o SEF foi um modelo de administração pública especializada e eficiente, que garantiu segurança, legalidade e respeito pelos compromissos internacionais de Portugal.
A sua extinção não resultou de falência estrutural, mas de contingência política, sustentada em argumentos conjunturais e em perceções mediáticas que, perante a incerteza e a descoordenação evidentes, não só comprometeu a eficácia na gestão das migrações e controlo de fronteiras em Portugal, como criou uma espécie de “trauma institucional coletivo”, conforme expressão usada por vários antigos dirigentes em entrevistas públicas.
A extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) e do corpo especializado de inspetores da carreira de investigação e fiscalização provocou uma rutura estrutural sem precedentes na história da Administração Pública portuguesa e um lamentável retrocesso, de mais de 30 anos, na capacidade do Estado em matéria de gestão das migrações.
A verdade institucional não morre com o decreto que extingue o nome de uma organização; sobrevive nas memórias de quem serviu e nas páginas de quem a documenta.
Associação Para Memória Futura PMFSEF | 15 novembro 2025